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| Guardador de Gado |
António José Gomes, mais conhecido por Ti Sargento, foi um poeta popular de Terena. Toda a sua vida foi guardador de gado. É autor de umas décimas relacionadas com os cinco elementos da vida, que ele designa como sendo o sol, a lua, a terra, a água e o ar. Disse-me uma vez, em finais da década de setenta, concretamente em setenta e sete, quando com ele falei para me dar colaboração através dos seus versos para a edição de um caderno de poesia popular alentejana que, quando a mãe morreu, tinha treze irmãos. A primeira ideia que me veio à cabeça, foi esta. Se este homem tinha treze irmãos e uma vez que eram pobres, como deve ter sido difícil a vida desta família. É preciso lembrarmo-nos que estas pessoas tiveram o seu início de vida há um século e como seria difícil a sobrevivência daqueles treze irmãos naquela época. Parece-me que só conheci quatro. A ele e mais três. O Manuel, o Inácio e o José. Honrado era a sua alcunha.
Se já nutria por este homem uma enorme simpatia, então a partir daquele momento a minha admiração por ele aumentou. Nos últimos anos da sua vida morou na Rua do Forno, três portas mais abaixo da minha casa, precisamente onde morou a minha avó materna. Era a casa da minha avó Angélica, que após a sua morte, os herdeiros venderam. O ti Sargento, era uma pessoa de uma enorme vivacidade.
Apesar de ser uma pessoa semianalfabeta, falar com ele representava uma aprendizagem constante. Há sempre coisas que os velhos sabem e que os novos desconhecem, embora a estes lhes pareça que tudo sabem. Mais até que os velhos. Apesar de, na época estar nos meus trinta e cinco anos, nunca pensei assim. Seria até uma grande falta de educação. Ouvi o homem com toda a consideração e respeito. Então quando me começou a dizer as décimas sobre os cinco elementos da vida, mais se cimentou a minha admiração por aquele ser franzino que filosoficamente se referia aos cinco espíritos unidos como sendo os cinco sentidos. Pensei para comigo. Como é que era possível aquele homem franzino, semianalfabeto, dizer de cor umas décimas com uma filosofia de vida tão aprofundada? E então perguntei-lhe. Ó ti Sargento! Como é que fez estas décimas? Como é que se lembrou duma coisa destas? É tudo daqui. E bateu levemente com o dedo na fronte. Gravei, tomei notas, agradeci e despedimo-nos.
– Eu sorri.
– Boa viagem, disse-me ele.
– Entrei em casa e despedi-me com dois beijos na minha mãe.
E o ti Sargento, lá ficou com o braço no ar a acenar-me.
Autor: Luís de Matos

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